O POST X da série
COVID 19 aborda a importância de efetiva transparência pública e direito de
acesso à informação por todos os cidadãos, que poderá acompanhar as medidas
adotadas pelo Poder Público, em especial em tempos de pandemia, que exige
medidas diferenciadas e, por vezes, rápida para alcançar o melhor resultado. A advogada
e mestra em direitos humanos, com especialidade em transparência, Rossana
Jansen* é autora deste Post.
01.A
transparência e o acesso à informação: marcos jurídicos internacional e
nacional.

Desde
o sistema regional de proteção dos direitos da pessoa humana, a sentença da
Corte Interamericana no caso Claude Reyes e Outros versus Chile (OEA, 2006) foi
emblemática no sentido de reconhecer que o direito à liberdade pensamento e de
expressão comprende não somente o direito a expressar as próprias ideas, mas
também o direito a “buscar” e a “receber” informação pública em poder do
Estado. Portanto, o direito de acesso à informação é um direito humano derivado
do direito à liberdade de pensamento e de expressão inscrito no Art. 13 da
Convenção Americana. (OEA, 1969).
Nesse
sentido, o livre acesso à informação é ferramenta que possibilita ao cidadão
exercer seus direitos políticos em uma democracia. Tal direito tem o papel de
prevenir abusos por parte de agentes públicos, inclusive de prevenir atos de
corrupção; além de promover o dever de prestar contas (“accountability”)
e a transparência na Administração. (OEA, 2009)
No Brasil, toda
pessoa tem direito a solicitar o acesso à informação de posse da Administração
com base na Constituição de 1988 e na Lei de Acesso à Informação- LAI (2011). É
desnecessário que o cidadão demonstre interesse pessoal na obtenção da referida
informação, sendo-lhe vedado o acesso somente em caso de exceção legal. Destarte,
a transparência é a regra, ao passo que o segredo constitui exceção.
Tenha-se em mente que a o acesso a informação não constitui fim em si
mesmo, haja vista que a informação servirá à tomada de decisão informada pelo
gestor, ao monitoramento de determinada política pública de saúde pelo usuário,
ou ao exercício de um direito pelo particular, conforme o interesse e o perfil
do solicitante, por exemplo.
Apesar
dos avanços em matéria de transparência pública no país, a implantação de uma
cultura de transparência todavia encontra entraves estruturais, a saber: o
modelo de gestão burocrático-patrimonialista e a tecnocracia (Bobbio, 2013); o elevado
analfabetismo funcional; o baixo nível de inclusão digital; o baixo nível de competência
em informação (“information literacy”), isto é, a pouca habilidade em localizar,
colher, avaliar e manejar a informação. (Castro Junior, 2019)
02.
Transparência pública e o Novo Coronavírus
A situação emergencial
deflagrada pelo Novo Coronavírus reclamará do Estado brasileiro o fornecimento
à população de informação clara, objetiva e não-fragmentada sobre a evolução da
pandemia em território nacional e sobre as estratégias adotadas no
enfrentamento para controlar a disseminação do vírus e minimizar os efeitos negativos,
sobretudo sua letalidade.
Em tempos de
pandemia por Covid-19, a informação fiável é um imperativo, pois que tem o
poder de salvar vidas. Isto porque os dados atualizados servirão de base à
tomada de decisão informada pelas autoridades no que concerne à adoção de medidas
sanitárias, inclusive de medidas orçamentárias para enfrentamento à pandemia
por Covid-19.
Logo, o Poder
público continua obrigado a disponibilizar informação clara e compreensível a
toda a população, mediante ampla divulgação em diversos formatos (boletins
informativos, gráficos, cartilhas, vídeos etc.) e canais (tv, rádio, mídias
digitais).
Infelizmente, as “fake
news” (falsas notícias) têm sabotado os esforços das instituições
sanitárias, científicas e da Administração pública no controle da pandemia por
Covid-19. Tanto é assim que o Secretário das Nações Unidas (ONU, 2020) alertou
para aquilo que ele nomeou como “perigosa epidemia da desinformação”,
caracterizado por conselhos danosos à saúde, falsas curas, teorias da
conspiração e discurso de ódio orientado a determinados grupos.
A fim de neutralizar
“fake news” causadoras de desorientação, e até mesmo de pânico, recomenda-se
recolher informação junto às autoridades sanitárias e científicas renomadas
como, por exemplo: a Organização Mundial da Saúde - OMS e a Fundação Oswaldo
Cruz - FIOCRUZ.
Ademais, em se
tratando de websites ou mensagens de WhatsApp suspeitos, recomenda-se, antes do
compartilhamento, checar a fonte e data, ainda avaliar o propósito da postagem.
(OEA, 2020) (University of Idaho, 2020) Cuidados simples que pouparão vidas em
época de pandemia.
03.
Conclusões
Caberá ao Poder
público primar pelo dever de prestar contas, por uma comunicação fiável e eficaz
de seus atos e decisões, estreitando os canais de diálogo junto a sociedade
civil organizada e ao cidadão em geral. Aqui, merece destaque o papel dos órgãos
de controle, na qualidade de portadores de conhecimentos técnicos dotados de
complexidade e exclusividade (Bobbio, 2013), os quais funcionarão como
interface entre os cidadãos e os gestores, no sentido de monitorar e, por
conseguinte, garantir o fornecimento de dados fidedignos, compreensíveis e
atualizados.
Por sua vez, o
cidadão terá que desenvolver e/ou aprimorar habilidades de avaliação e manejo
da informação (“information literacy”), principalmente em plataformas
digitais, com vistas ao engajamento consciente em assuntos de interesse coletivo,
ao exemplo da questão sanitária pública envolvendo o combate ao Covid-19.
*Rossana Jansen é Mestre em Direitos Humanos (Universidad Carlos III), Mestre em Estudos Anticorrupção (International Anti-corruption Academy), Especialista em Transparência, Acesso à informação e Accountability (Universidad de Chile).
Referências Bibliográficas
Bobbio, N. (2013). Democracia y secreto. 1ed. [ebook]
México, D.: Fondo de Cultura Económica.
Castro Junior, O. V. (2019).
Competência em informação e inclusão digital no Brasil. Revista CGU, [online] Volume (11) p.p. 1041-1052.
[Acesso em: 27 Junho 2020].
INTOSAI. (2010). ISSAI 20 - Princípios de transparência eaccountability. [Acesso em: 29 junho 2020].
OEA. (2006). Caso ClaudeReyes y Otros Vs. Chile. [Acesso em: 27Junho 2020].
OEA. (2020). Comunicado de Prensa R58/20. COVID-19: Los gobiernosdeben promover y proteger el acceso y la libre circulación de la informacióndurante la pandemia - Expertos internacionales. [Acesso em: 29 Junho 2020].
OEA. (2020). Comunicado de
Prensa R78/20. CIDH y su RELE expresan preocupación por las restricciones a lalibertad de expresión y el acesso a la información en la respuesta de Estados ala pandemia del COVID – 19. [Acesso em: 27 Junho 2020].
ONU. (2020). COVID-19: chefe da ONU alerta para “epidemia dedesinformação”. Disponível em: [Acesso em: 29 Junho 2020].
University of
Idaho – Library. (2020). Information literacy Portal. Evaluating websites. [Acesso em: 29 Junho 2020].
* Mestre em Direitos Humanos (UC3M), Mestre em Estudos Anticorrupção (IACA), Especialista em Transparência, Acesso à informação e Accountability (UNICHILE).
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