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foto de Pedro Américo (1893) |
21 DE ABRIL – TIRADENTES. Conhecer a história permite um olhar diferenciado sobre fatos, que por sua repetição na narrativa, cravam no imaginário social, mitos e heróis, por vezes
forjados, ou atendendo a interesses diversos.
Em atenção a
data, 21 de abril, o ACONTECEU NA HISTÓRIA
traz a República Velha, a Coroa Portuguesa, a Capitania de Minas Gerais, e Joaquim José da Silva Xavier
(Tiradentes)
Voltando aos
tempos coloniais em 3, 2, 1...:
TIRADENTES:
O MITO DA REPÚBLICA VELHA
Segundo o dicionário Caldas Aulete, mito significa tanto historias
fantasiosas de origem popular quanto pessoas reais ao qual são atribuídos
feitos extraordinários ou imaginários.
Ao longo da história, a humanidade se
valeu dos mitos tanto para explicar a realidade ao seu redor (como por exemplo
o Titã Prometeu, na mitologia grega, que criou a humanidade como uma versão menor
e menos poderosa dos Titãs, utilizando para tanto o barro e da lama) quanto
para levantar o orgulho e a autoestima de determinado grupo populacional (a
Cidade-Estado grega de Atenas constantemente utilizava-se da história de Teseu,
herói semideus filho de Poseidon e considerado um dos primeiros reis de Atenas,
para exaltar a coragem e o valor dos atenienses).
Em resumo, a humanidade sempre precisou
e ainda precisa dos mitos tanto para dar substancia a sua própria realidade
quanto para serem os “heróis” idealizados a lutarem por uma causa defendida por
outros. Regimes políticos não são diferentes, tais como se deu na Primeira República do Brasil, popularmente
conhecida como República Velha.
A República Velha foi a sucessora do Império brasileiro no fim do Séc. XIX, originada
da traição do então Marechal Deodoro
da Fonseca para com seu “amigo” Dom Pedro II, então Imperador dos brasileiros.
Foi fundada em 1889 e finalizada em 1930, pelos eventos que originaram a Era
Vargas, existindo por um total de 39
anos, sendo até hoje o segundo período político de maior duração no Brasil
(apenas superada pelo Império, que durou 67 anos).
Após ter sido implementada, a principal
missão ideológica da República Velha foi a de apagar ao máximo a presença,
tanto de Portugal quanto do Império brasileiro da imagem
nacional, sendo o primeiro visto como um Estado predador opressor; e o segundo,
como defensores de escravos e opressores do povo brasileiro. Para tanto foram
tomadas várias medidas desde a “importação” de hábitos e costumes franceses para
a sociedade brasileira, na tentativa de apagar os portugueses, bem como
objetivando que fosse ocultado o papel de Dom Pedro II no Brasil e seus feitos,
que o levaram a ser reconhecido na época, como um mecenas que sempre buscou
fazer o melhor para o Brasil.
Porém, tais medidas não foram o
bastante. Era preciso uma figura histórica, alguém que poderia ser utilizado
para representar a vontade dos brasileiros em viver uma democracia, bem como
sua unidade enquanto um povo. Não se poderia utilizar a imagem nem dos
portugueses que colonizaram e “civilizaram” o Brasil (afinal, eram tidos por
ladrões em busca das riquezas nacionais) nem a dos Imperadores e seus
associados (afinal, eram tidos por tiranos opressores defensores da
escravidão).
Isso deixou os ideólogos da República
Velha com poucas opções (na falta de palavra melhor), até que então foi
recordado a História de um pobre e irrelevante garoto de recados das elites
mineras durante sua conspiração contra um dos impostos da coroa portuguesa. Seu
nome? Joaquim José da Silva Xavier,
popularmente conhecido como Tiradentes.
Sem se alongar muito sobre a
Inconfidência Minera, tal movimento foi a tentativa das elites mineras de se
libertarem de Portugal, em razão da cobrança do chamado quinto, no qual 1/5 de todo o ouro escavado na Capitania de Minas
Gerais pertenceria a Coroa, situação intolerável tendo em conta que o
extrativismo do ouro havia começado a entrar em decadência na Capitania, forçando
as elites locais a desejarem se desvencilhar da Coroa portuguesa, situação essa
que levaria inevitavelmente a Independência da Capitania de Minas Gerais da
então América portuguesa.
Dentro os diversos participantes,
pode-se destacar Tiradentes, que era o único integrante da Inconfidência que não
fazia parte da elite local e, portanto, visto como o mais dispensável de todos
os membros, cuja maior função era enviar e levar mensagem entre os demais
integrantes da Inconfidência. Após um dos integrantes chamado Joaquim Silvério
dos Reis ter traído o seu grupo, ao denunciar a existência do movimento posteriormente
chamado Inconfidência Mineira, em troca do perdão de suas dívidas para com
Portugal, Tiradentes (Joaquim José da
Silva Xavier) e os demais integrantes foram presos.
Por alta traição à Coroa, eles deveriam
ser todos sentenciados a morte, porém ao se levar em conta que a maioria de
seus membros eram parte da elite minera, sua execução não seria bem vista por
outros “bem favorecidos”; e, portanto, a maioria deles foram ou condenados à
prisão perpetua no território brasileiro ou exilados para outros domínios
distantes de Portugal, como Angola e Moçambique. Por ser o único membro “irrelevante” da Inconfidência Minera do
ponto de vista econômico, Tiradentes foi o único a ser
condenado a morte, por esquartejamento. Conta-se que seus apoiadores clamaram
para que a Rainha de Portugal, Maria I (ela própria, a famosa Rainha louca)
concedesse o perdão pelo “crime” de Tiradentes enviando presentes, e ela de
fato concedeu, mas quando a anistia chegou em território brasileiro (ante a
ausência de email, whatsapp ou a cobertura da imprensa por 24 h, como hoje em
dia), Tiradentes já havia sido esquartejado.
Tiradentes era tudo que os ideólogos da República
Velha esperavam. Um homem pobre e humilde, que lutou pela “liberdade” do Brasil
(quando na verdade, o máximo que ele iria “libertar” seria Minas Gerais) e que
foi preso pela “perversa” e “predatória” coroa portuguesa e infamemente
esquartejado por ordens dela. O herói trágico perfeito para ser o símbolo tanto
da República Velha, quanto da luta do povo brasileiro pela justiça e pela
democracia. A imagem que está no topo deste artigo, feita por Pedro Américo em
1893, busca justamente comparar Tiradentes com Jesus, mostrando aquele como o
grande mártir do Brasil que morreu por ele, assim como Jesus morreu pelo que
viria a ser a cristandade. Obras e homenagens como essa foram comuns durante toda
a República Velha, de modo a tentar fixar no imaginário do povo brasileiro a
imagem de seu mito fundador.
No fim das contas, Tiradentes foi, e
ainda é, o grande mito do Brasil em defesa da liberdade e da democracia, uma
vez que não existia mais ninguém que poderia valer-se dessa função, e por isso a República Velha em seu alvorecer, resgata história ocorrida no Brasil colonial, anterior ao Império, sendo sua
imagem completamente superestimada para tal, tanto que 21 de abril é feriado
nacional em sua homenagem. Esta homenagem é devida? Não cabe a mim responder,
até porque todos os “heróis” da humanidade cometerem faltas em uma coisa ou
outra (afinal, nós humanos não somos nem bons nem maus, somos apenas humanos)
e, como diz uma frase anônima: é melhor se lembrar dele pelo que dizem que foi,
do que como realmente foi.
Fica essa reflexão para esse dia. Bom
feriado a todos.
DEMETRIUS
SILVA MATOS
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